Síndrome do Pânico - uma perspectiva simbólica

Síndrome do Pânico - uma perspectiva simbólica

Na mitologia grega, Pã era considerado o deus dos campos, dos rebanhos e dos pastores. Para alguns era filho de Zeus com Calisto; para outros, de Hermes com Penélope e, a versão mais difundida é que era filho de Hermes e da ninfa Díopre. Ele nasceu metade humano, metade bode – um sátiro – portanto, muito feio, o que fez com que sua mãe fugisse. Então, Hermes o levou para o Olimpo e lá foi motivo de zombaria para os outros deuses.

De volta a terra, foi criado e educado pelas ninfas (deusas não olímpicas, deusas menores portanto, que habitavam a terra) e participava dos festejos que elas promoviam.

Pã era um deus irreverente e vivia assustando com seus gritos todos os solitários que atravessavam as florestas. Daí surgiu a palavra pânico. Ele era adorado dentro de cavernas escuras que causavam medo. Por isso, a energia arquetípica que esse deus faz emergir gera tanto fascínio e temor ao mesmo tempo. É a representação da máxima psicológica que diz “medo igual a desejo”, isto é, o “tamanho” do medo é proporcional ao “tamanho” do desejo. E, como as duas forças são equivalentes, há uma parada. Imagine aquele jogo, o cabo de guerra, no qual uma turma puxa a corda de um lado e a outra turma, do outro lado, puxa com a mesma força. Não há movimento, e isso é o pânico. A pessoa simplesmente fica “paralisada” diante do objeto temido/adorado.

A energia do deus Pã está associada aos impulsos sexuais e instintivos, pois Pã era natural, selvagem e amoral. Pã indica a necessidade de confrontação com aspectos sombrios da personalidade.

Pã, certa vez. interessou-se pela ninfa Siringe e começou a perseguí-la. Para fugir do assédio de Pã, que era tido como hiperativo sexualmente e passível de cometer estupros, ela se transformou em junco. Pã apanhou alguns juncos e os amarrou, transformando assim num instrumento, a flauta de Pã ou a Siringe

A palavra “pan” em grego significa “tudo”, portanto o deus Pã é expressão da totalidade da Natureza.

Quando nos deparamos com pessoas portadoras da Síndrome do Pânico percebemos sua angústia frente ao novo, sua dependência de alguma figura importante, o temor de rejeição e abandono. E, via de regra, as pessoas que os conhecem acham que eles estão apenas querendo chamar a atenção, tendo chiliques. É uma situação dramática. O pior é que muitas vezes os portadores da síndrome nem mesmo conseguem identificar o que os apavora tanto. Parece que os fantasmas do inconsciente virão atormentá-los. Todos são unânimes em relatar o medo de morrer ou de passar mal e não ter auxílio, aspectos que os tornam dependentes de outras pessoas. Passam por vários médicos procurando por alguma saída ou se descobrem alguma doença, e, ficam mais angustiados por descobrirem que não há uma doença física. Tudo vai bem. Mas por que permanece tão intenso medo de morrer?

Em geral, não queremos nem pensar na morte. Todos a queremos a distância. Entretanto, o portador da síndrome do pânico, sente-se constantemente ameaçado pelo medo de morrer. Vários autores dentro da psicologia apontam que o medo da morte equivale ao medo de viver. vivencia-se, portanto, a polaridade oposta daquilo que tememos. Para os portadores da síndrome viver é ameaçador. O viver, que deveria ser encarado como encorajador na busca de prazeres, afetos e realizações, passa a ser visto como destrutivo.

Mas há uma lógica nisto, visto que o viver nos leva a destruir, derrubar ou transformar conceitos e padrões de comportamentos que vão tornando-se inadequados com o passar dos tempos.

Pela observação clínica, em meu consultório, vi nos portadores da síndrome do pânico uma forte rigidez, quase inabalável com relação aos seus valores, na verdade, valores de seus pais, da cultura e da comunidade em que está inserido. Valores que um dia eles chegaram a questionar, mas o medo de desafiá-los foi tão intenso que, inadvertidamente, eles os lançaram para seu mundo sombrio, interior e profundo. Estes, portanto, são os fantasmas temidos: aceitar que carrega dentro de si valores discordantes dos vividos até então – não implica em questionamentos de certo e errado, moral ou imoral. Por exemplo, uma mulher casou-se, teve dois filhos e trabalha fora. O casamento não é nem foi fonte de realizações, mas uma obrigação, atendendo aos padrões de sua família. De repente, aparentemente sem qualquer razão, essa mulher passa a sentir um intenso medo de andar sozinha pela rua, de dirigir, de sair de casa para o emprego ou vice-versa. É bem possível que seu inconsciente tenha lhe enviado mensagens através dos sonhos, mas ela não percebeu dos fatores ou acontecimentos que precipitaram o início do quadro de pânico.

Temos aqui um sério conflito entre o que se deseja e o que se faz, há um desequilíbrio entre o interior e o exterior mas de maneira tão equivalente que há uma paralisia, não se pode avançar nem para um lado nem para outro, por isso, ela não consegue se dirigir para o trabalho nem para casa. Percorrer esse trajeto implica em atravessar a ponte de um lado para outro e o medo é de ficar no meio. Então, percebe-se que não é apenas o casamento que não traz realizações, o trabalho também não! Na verdade, essa mulher não consegue realizar-se como pessoa, realizar seus desejos mais íntimos e profundos.

Observando-se o mito de Pã o que podemos relacionar? Ele era um deus natural e instintual, aspectos diretamente relacionados à sexualidade, que em Pã aparece totalmente exacerbada. Há uma estreita ligação com o corpóreo, com a sexualidade e também com a afetividade na síndrome do pânico. Continuando com o nosso exemplo, a mulher percebeu que não vivia sua afetividade e sexualidade como algo prazeroso e realizador, mas tudo fazia parte de um modelo que lhe foi imposto. Essa mulher, provavelmente, terá dificuldades de compartilhar seus sentimentos e desejos com seu parceiro. “O que ele vai pensar de mim?” Pode ser que tudo isso fique no nível do inconsciente, total ou parcialmente, até que no processo de análise (psicoterapia) ela confronte esses aspectos negados ou reprimidos e venha a aceitá-los como parte de si mesma, e, consequentemente, possa expressá-los de maneira positiva, autoconfiante, podendo, a exemplo de Pã, viver de maneira mais natural com relação aos seus recursos internos.