A evolução do feminino ferido: a personagem Carol do seriado The Walking Dead

A evolução do feminino ferido: a personagem Carol do seriado The Walking Dead

O seriado The Walking Dead tem como tema uma epidemia que contamina os seres humanos transformando-os em zumbis. Um grupo de sobreviventes compõe os personagens principais da trama. Entre eles encontramos Carol – uma mulher por volta dos seus 40 anos, casada com um homem muito rude, grosseiro e cruel, e, mãe de uma filha pré-adolescente.

Carol é o exemplo da mulher que cuida do marido, da filha e dos afazeres domésticos. Seu marido apresenta comportamentos desprezíveis principalmente contra ela, agredindo-a frequentemente física e emocionalmente. Ela é bem submissa e passiva, e, inúmeras vezes é defendida por outros elementos do grupo (tanto por homens quanto por mulheres). Mas ela sempre fica ao lado do marido.

Após vários incidentes, o marido morre e ela enluta com muita raiva do grupo. Em seguida sua filha desaparece; seu foco passa a ser encontrar a filha. Nesse período revela a mulher insegura, com baixa autoestima, carente e que tenta ter um romance com Daryl, personagem um tanto marginal, interiorano, sensível e racional que se dispôs a buscar pela garota desaparecida.

Depois de matar a própria filha, pois a encontrou já transformada em zumbi, Carol inicia sua transformação. É como se a morte da filha representasse simbolicamente a morte da sua própria inocência; ela nada mais tem a perder. Inicialmente mostra-se submissa e passiva quanto ao que o mundo puder lhe oferecer, mas vai crescendo e lutando por sua sobrevivência e pela sobrevivência dos demais.

Permite que sua racionalidade desbanque as ilusões, as fraquezas, as inseguranças e com isso dá corpo a uma mulher forte, que sabe o que precisa ser feito a despeito das emoções e sentimentos que surjam.

Aprende que deve prover os demais com os conhecimentos de sobrevivência, e quando sua atuação não é bem aceita pelo líder do grupo e também por não aprovar alguns aspectos do líder e a liderança vigente, é expulsa do grupo e sai em busca do único objetivo possível: sobreviver.

Nesta jornada solitária há uma melhor estruturação do seu ego, os fatos sobrepujam toda e qualquer ilusão e aprende a lidar com os fatos como eles são, como se apresentam, sem perder tempo com os “achismos” ou com os “e se?”. Ela encontrou outros grupos, quase morreu, e foi se desapegando de sua persona (boazinha, sociável) e acordou para quem realmente era.

Na atual temporada (6ª) ela reaparece demonstrando a sua força e tornando-se um pilar representativo da luta pela sobrevivência e da gestão de recursos. Aparece como a “mulher inteira”, com o ego estruturado e o animus (contra parte feminina) integrado positivamente trabalhando para seu crescimento e autocontrole.

Seu ego (o seu feminino) aparece na lidas com a alimentação do grupo – cozinhando e ensinando a cozinhar; seu animus se revelando no sentido de mantê-la fazendo o que deve ser feito.

A personagem abandonou a posição de vítima, de passividade e submissão para se tornar agente de sua própria vida, sendo capaz de escolhas difíceis e pagando o preço pelas mesmas.

Mas Carol não abandonou seus sentimentos e emoções; se mantém empática e sensível, mas apenas deixou de ser levada pura e simplesmente pelas emoções.

Sua força interior veio do fato de ter lidado com os traumas da violência marital de maneira singular: percebeu que a força do marido fora dada por ela, por sua submissão. Não responsabilizou ninguém, mas a si mesma, por permitir que ele a subjugasse e por não ter confiado em sua própria capacidade para lutar contra isso e defender-se. Daí passou não só a defender-se como a ensinar aos outros a se defenderem e a se autoafirmarem diante da vida. Não se tornou uma salvadora, embora muitos possam vê-la assim, mas tornou-se aquela que promove em cada um o desejo de responsabilizar-se por si mesmo.

Não sei o que farão com a personagem, mas ela revela que as mulheres só são frágeis e incapazes se assim acreditarem, caso contrário são capazes de autorrealizarem-se, de autorrespeitarem-se e de não pactuar com a vitimização. Isto ocorre quando a mulher faz as pazes com seu animus transformando-o em aliado e não no inimigo.

Este é o tipo de mulher que deveria nos representar: a que deixa para trás a falsa fragilidade e a projeção da força na figura masculina, e, assume honestamente sua força de regular o seu destino.